Os ovos
da mamãe pata finalmente se quebraram e deles saíram lindos patinhos. Um só
restou. Um ovo grande esquisito recusando-se a partir. Mamãe pata pediu
conselhos à pata conselheira e foi advertida de que não deveria chocar aquele
treco esquisito. O certo é que fazia tanto tempo que ela o vinha chocando,
porque não mais um pouco, raciocinou a mãe dos patinhos belos. Finalmente o
enorme ovo rachou e de dentro dele saiu a mais desajeitada das criaturas. Uma
coisa feia de doer, de olhos rosa transparente, pele marcada por veias azuis e
vermelhas, pés de um roxo claro. Meu Deus, pensou mamãe-pata, o que papai-pato
vai pensar? O peru andou rondando a casa, e eu que estou inocente, o que é que
vou fazer. Se essa coisinha feia não souber nadar estarei perdida. O que dirá
Ana pata? O que dirão minhas amigas? Devo ficar indiferente ou mostrar que me
preocupo? Mas, o esquisito sabia nadar muito bem, para sossego de todos. Assim
mesmo, o pobrezinho não foi bem aceito na fazenda, outros patos judiavam dele e
o faziam de central de bicadas. Sua mãe tentou defendê-lo à princípio, mas logo
se cansou. Ela começou a ficar sem ânimo, já não acreditava que ele pudesse
melhorar. E o pobre patinho feio não achou outra alternativa senão fugir. Ele
esteve em lugares inóspitos, correu risco de vida, não conseguia identificar-se
com nenhum animal nem eles com ele. Passou por inúmeras casas e foi agredido em
todas, assim passou o inverno e chegou a primavera. O patinho que andava fugido
de uma vassourada encontrou um lago onde entrou e começou a boiar. Ele abriu
suas asas e percebeu que eram grandes e fortes. Voou alto e de cima percebeu
três cisnes maravilhosos que boiavam no lago. Ele nunca tinha visto nada tão
lindo. Os cisnes riram e ele teve medo de se acercar deles e de ser novamente
maltratado. Mas não pôde aguentar e desceu para o lago. Lá os cisnes começaram
a nadar em sua direção. O patinho acreditou que fossem matá-lo e abaixou a
cabeça para aguardar os golpes. Mas que lindo! Na água havia a imagem do mais
esplendoroso cisne jamais visto: ele mesmo. As crianças que estavam no local
aproximaram-se e louvaram sua beleza. Sua família se acercou dele, tocando-o
com carinho e pela primeira vez ele fez parte da humanidade!
Esta
história publicada por Hans Christian Andersen em 1945, fala de um ser
abandonado à sua própria sorte porque não está de acordo com o padrão exigido
pela comunidade. Sua própria mãe o abandona sem imaginar que ele tem
qualidades, influenciada pelo que os outros vão pensar dela. Talvez ela
soubesse no fundo quem ele era, mas o desânimo, a falta de confiança em sua
própria intuição, as oscilações sobre que caminho tomar, o cansaço no
dia-a-dia, a indefinição sobre que caminho tomar, levaram-na ao abandoná-lo.
Quantas vezes não agimos assim com potenciais existentes dentro de nós. Se nos
parecem estranhos, nós os exilamos, apontamos a eles a porta da rua,
desacreditamos de que possam transformar-se em cisnes magníficos. Ou
pior, ficamos ali, cisnes a conviver em meio aos patos, numa existência muito
aquém da que merecíamos. Somos cisnes ou patos? Não importa. Importa que em
sendo cisnes ou patos possamos agir como tal, sem incerteza, sem indecisão, sem
desânimo ou desesperança!
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