Há
um texto de Carlos Drummond de Andrade, publicado no livro Novos Poemas chamado
Enigma. Fala de pedras que caminham pela estrada e algo lhes barra o caminhar.
Elas se interrogam – conheciam o perigo dos objetos, na verdade sabiam de cada
objeto que poderia obstar-lhes a caminhada - e agora? O que lhes tolhe a
passagem, agora, é desconhecido. É a Coisa. Algo que não sabem definir e é como
um enigma. Segundo o texto é mal dos enigmas não se decifrarem a si próprios
nem querer que outros os decifrem. A Coisa se assemelha ao enigma. É função
dela barrar caminhos. Posteriormente travará o avanço das árvores, dos ventos,
dos pássaros e o de toda a vida.
Ao
ler o que Drummond escreveu fiquei muito tocada. Pensei sobre o amedrontador em
nossas vidas. Sobre algo do qual não podemos escapar. Algo que não deciframos,
que não se deixa decifrar, pois não é para ser decifrado, não podemos sabê-lo,
não podemos perguntar-lhe sobre o que é, para que serve, a troco de que se
interpôs entre nós e nossos passos. Nós que nos julgamos tão inteligentes, tão
donos de nossos destinos, portadores de gordos egos e de brilhantes mentes por
mais avançados que estejamos, percebemos que sempre haverá algo a nos escapar.
Faz parte de nossa condição humana o saber de muito, mas não do todo. Como se
fosse preciso colocar-nos freios para que não nos sintamos todo poderosos,
quase Deuses.
O
que temos é Medo. Medo de admitir que muito foge do que chamamos razão, que não
podemos descobrir a verdade de todas as coisas. A irracionalidade de repente se
apresenta diante de nossos olhos e tememos nossa ignorância. Gostaríamos de
predizer tudo para manipular os cordões de nossas vidas. Queremos dissecar tudo
e tudo entender. Sofremos muitas vezes de estupidez. Pois podemos dizer que é
possível que algo aconteça conosco baseados em fatos, mas não sabemos se
realmente acontecerá. O que temos são probabilidades. Domínio da Física
Quântica, da qual entendemos muito pouco, que fala da luz como sendo ao mesmo
tempo onda e partícula e da posição de elétrons que não sabemos o que é, mas
sabemos como se comporta.
Nos
mitos e nas estórias de fadas temos muitos heróis que vão em busca de algo,
devem resgatar algo. Nem tudo pode ser perguntado. Nem tudo é esclarecido. O
herói está à mercê do numinoso, aberto para receber informações do Que Tudo
Sabe. Aberto a probabilidades. E, no entanto ele não está sozinho, se admite
sua pequenez, se admite a grandiosidade daquilo que lhe é desconhecido, ele se
liberta e traz para o mundo algo como presente não só para si, também para a
humanidade. Algo transformador. O herói pode ser água ou fogo, contornar as
adversidades ou enfrentá-las deve, sim, fazer escolhas, porém sempre cônscio de
que seu comando sobre as coisas é apenas parcial. Os Deuses são generosos
quando respeitados.