Este corpo meu
mora comigo desde sempre. Vem se modificando. Já foi tenro, invólucro pequeno.
Foi crescendo. Tornou-se forte, jovem continente. Caminhando vai para tornar-se
mais frágil. Um dia há de perder a forma para enfim findar voltando ao pó de
origem. Se acredito nele como algo independente, cuja função é apenas a de
guiar-se pelo curto espaço em que existir é natural que eu me sirva dele apenas
para a realização dos meus desejos. Não será estranho que eu cuide
exageradamente desta capa que me cobre em busca de evitar seu desmoronamento,
mesmo sabendo que isto é impossível?
Nada a opor
quanto ao cuidado corporal. Afinal creio que o corpo é a morada de algo mais
que na verdade sou eu ou “é a minha verdade”. Penso que o corpo está aí como
instrumento para nos vivenciarmos como homens neste mundo. É o carro que nos
leva a passear através de cujas janelas observamos a vida. Se o tratarmos como
a casa em que moramos devemos mantê-lo limpo, em bom funcionamento, sem
defeitos no encanamento, na parte elétrica. Devemos conservar sua pintura,
cuidar do jardim, limpar assoalhos, remover teias de aranha, evitar que o sótão
se encha de quinquilharias. Mas, quem cuida da casa? Será o ego? Será este
senhor que tememos perder? Este pequeno ponto em meio a infinitos pontos? Eu
diria que o ego é uma parte da casa. Algo assim como o gerente para assuntos do
mundo. O senhor do eu quero. Ele pensa que é o dono da casa, mas não é. Pensa
que é todo poderoso, mas não é. É um ponto de referência, o lugar onde residem
nossas experiências de vida, nossas impressões sobre estas experiências, os
elementos que constituíram nosso caráter. O ego conhece aquilo que ele
vivenciou, aquilo que veio a ele através dos sentidos, aquilo que a mente
traduziu.
A casa pensa: Eu
sou muito importante. O gerente aí, não pode viver sem mim. Se eu não existir
ele já era! O ego pensa: eu sei de tudo, eu sou um senhor “grande coisa” sem
mim a casa não teria consciência de nada e seria uma concha vazia. Ambos estão
certos. São importantíssimos! Porém, não são o mais importante.
Pensemos: se
corpo e ego são o mais importante para nós, por que não nos contentamos apenas
com nossas experiências e conhecimentos, com nossos corpos bem tratados e
firmes, com nossas mentes ágeis, com a realização de nossos desejos? Por que
temos infinitas vezes a sensação de que somos muito mais do que nossa vontade
pode satisfazer? Por que tantos relatos de pessoas que atingiram materialmente
altos patamares e que se sentem vazias e sem motivação? Por que momentos de
extrema sensação de paz são obtidos quando corpo e ego não estão no comando? A
resposta talvez seja encontrada se acreditarmos em algo que transcende o que
conhecemos, algo que habita a casa, algo que nos fornece consciência através do
“eu”, algo que nos envolve por todos os lados, que é grandioso demais para que
o encaremos, algo que ao ser sentido, tal a sua grandiosidade, falha ao ser
descrito.
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