Envelhecer



Envelhecemos todos os dias porque o envelhecer outra coisa não é que a passagem do tempo e Cronos come seus filhos sem dó nem piedade. Envelhecemos mesmo quando não nos damos conta disso, mesmo quando ainda não surgiram os sinais de velhice. Sabemos que somos seres fadados a envelhecer a não ser que morramos antes. No entanto a velhice nos surpreende. Surpreendemo-nos quando nos olhamos no espelho e percebemos, de repente, as primeiras rugas, a flacidez no rosto, a flacidez no corpo. Surpreendemo-nos com as primeiras inseguranças no andar, com o a constatação de que já não temos a mesma energia de antes. Não nos preparamos para a velhice, assim como não nos preparamos para a morte. O ficar velho, que faz parte de nossa estadia aqui na Terra, apresenta-se a nós como um castigo. Queremos evitá-lo a qualquer custo.

A indústria de cosméticos apregoa que pode adiar a passagem dos dias. Corremos como loucos contra o relógio. Hoje, mascaramos os sinais de velhice no decorrer dos quarenta, dos cinquenta, dos sessenta. Nada contra tratarmos do corpo, da pele, envelhecermos belos e atraentes. Porém há que ter certeza que a velhice virá. Ela nos concede um tempo e chega calma e tranquila a nos impor sua presença. Aos setenta não há como enganar ninguém.

Por outro lado, mesmo que consigamos enganar as pessoas - tive uma tia que diminuía de idade a cada década – não podemos nos enganar. Sabemos quantos anos vivemos, sabemos de nossas lutas, de nossos cansaços. Sabemos dos esforços que tivemos de fazer para esconder nossa idade.  Nossos olhos refletem nossas experiências, mesmo que o corpo as desminta.

A velhice não é aceita porque não nos preparamos para ela. Não se trata de nos tornarmos velhos(as) mocorongos(as). O cuidado com nossa aparência é e deve ser fundamental. Podemos chegar à velhice belos(as), atraentes e plenos mentalmente, intelectualmente, espiritualmente. Não chegaremos, porém, se não a aceitarmos. É como deixar algo guardado no armário por muitos anos a portas cerradas. Um dia a porta será aberta e teremos que olhar o que deixamos de olhar. O impacto será então muito maior.

E porque não aceitamos a velhice nos afastamos dela e não respeitamos os velhos e não queremos olhá-los porque revelam o que nos tornaremos. O respeito a meu ver significa tratá-los como pessoas ativas e não como crianças balbuciantes, não como se não entendessem o que dizemos, não como se jamais tivessem vivido experiências como as nossas.

E porque não aceitamos a velhice nos tornamos velhos e sentimos culpa por chegarmos a tal fase da vida. E nos recolhemos, e temos medo de que a nossa presença incomode as pessoas. O círculo se torna vicioso.

É preciso que nos demos conta disso. É preciso mudar o conceito de que velhice é algo de que temos que nos envergonhar. O velho perde o poder da presença. Só não o perde o velho famoso. Imaginem se alguém vai depreciar um José Saramago!

Então como farão os velhos comuns e nós que nos tornaremos ou que estamos nos tornando velhos comuns para fazermos presença, para que nos enxerguem como seres em nova fase de vida, tão importantes quanto cada pequeno ser que habita nosso planeta?

Bem, penso que os velhos podem começar a parar de culpar-se porque são velhos, parar de se colocarem na posição de vítimas porque ficaram velhos. É um caminho.

No entanto o primeiro passo é começar por informar as crianças sobre os ciclos da vida. Nascemos, vivemos, morremos. Ficamos velhos. Tudo deve ser levado em conta. Tudo tem sua importância. Não somos melhores na infância, nem na juventude. Somos seres que evoluem, para os quais toda fase é importante. Devemos nos desgarrar do que já se foi para vivermos o novo. O novo da adolescência, o novo da maturidade, o novo da velhice.

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